Para as imobiliárias, a “selvajaria” na habitação não se combate com taxa do BE
Associação que representa as empresas de mediação de imóveis diz que há um problema no mercado de habitação, mas defende que a resposta não passa por restrições do lado da procura.
Tentar resolver os problemas da habitação em Portugal criando um novo imposto sobre o imobiliário “é uma medida populista, típica da aproximação de eleições, mas com consequências para a economia portuguesa que podem ser muito graves”. Quem o afirma é Luís Lima, presidente da Associação Portuguesas de Empresas de Mediação Imobiliária (APEMIP), que contesta a proposta do Bloco de Esquerda de criar uma taxa especial para penalizar a rotação de compra e venda de casas, não vendo nela qualquer solução para resolver os problemas da habitação no país.
O CDS-PP baptizou a proposta do BE como “taxa Robles” – numa referência ao polémico prédio colocado à venda pelo ex-vereador bloquista na Câmara de Lisboa num dos bairros históricos da capital através de uma imobiliária de luxo – e pela voz de João Almeida desafiou o Governo a dizer se tem abertura para avançar com a medida. Do lado do executivo de António Costa não houve ainda confirmação de que a iniciativa avança com o Orçamento do Estado de 2019, mas na segunda-feira Catarina Martins voltou a falar do assunto, mostrando-se confiante de que há “condições para ser aprovada”.
Representante do sector da mediação, Luís Lima afirma que todas as medidas tomadas do lado da procura no mercado de habitação representam “um crime de lesa-pátria” e, por isso, defende ser do lado da oferta que se deve actuar com medidas concretas. O presidente da APEMIP admite que existe “um problema muito grave” na habitação em Portugal e especifica mesmo que isso é visível “no arrendamento para estudantes e para a classe média ou mesmo com o despejo de inquilinos, muitos deles idosos, com recurso a medidas são verdadeira selvajaria, como cortar a água ou retirar corrimões”. Mas não tem dúvidas de que medidas como a que o BE está a propor só agravam a situação.
O líder associativo diz-se preocupado por não ver “ninguém a fazer o seu trabalho para resolver o grave problema de habitação que existe actualmente em Portugal”. E avança, por exemplo, que a APEMIP estima serem “necessárias pelo menos 70 mil novas casas em Lisboa e Porto, para satisfazer a procura”.
Para Luís Lima, “o simples anúncio da intenção do Bloco pode prejudicar a economia portuguesa” numa altura em que “surgem sinais menos positivos do turismo” – e o turismo e o imobiliário, diz, são neste momento “o ouro e o petróleo da economia nacional”. O presidente da APEMIP lembra que este tipo de anúncios trava o interesse de investidos estrangeiros, numa altura em que a procura de imobiliária se está a deslocalizar para outras regiões do país, reduzindo a pressão sobre Lisboa e Porto. O responsável alega mesmo que, com a proposta, o partido liderado por Catarina Martins “quer branquear o caso Robles”.
A proposta começou a ser ventilada pelo BE em Maio. Pouco antes disso, o Programa de Estabilidade apresentado pelo Governo em Abril à Comissão Europeia não desvendava qualquer impacto com uma eventual medida que se destinasse a captar receita do lado dos impostos sobre o rendimento e património em 2019. Essa era a realidade em Abril e nem todas as medidas que surgem a cada ano com o OE aparecem já contabilizadas nesse documento da Primavera que contém as linhas-mestras da estratégia orçamental a seguir. Do lado do Ministério das Finanças, porém, o PÚBLICO não conseguiu obter um comentário sobre a ideia bloquista.
Para o economista, “quem especula corre riscos [pode sofrer prejuízos elevados, como aconteceu antes da crise de 2008 no imobiliário], e as mais-valias já são declaradas em termos de IRS”. O que deve ser acautelado, assegura, “é que a queda dos preços não crie uma nova crise no país”. E neste domínio destaca que “medidas preventivas são aconselháveis”, dando como exemplo a recente iniciativa do Banco de Portugal para travar o endividamento excessivo das famílias e garantir a estabilidade financeira do país.
João Loureiro defende “a necessidade de estabilidade fiscal, quer ao nível do leque de impostos já existentes, que é excessivo, quer das respectivas taxas“. E considera não fazer sentido “proibir estrangeiros de comprar casas em Portugal, como não seria aceitável se os portugueses não pudessem comprar casa noutros países”. O académico lembra que foi o próprio Governo, neste caso o anterior, que os atraiu, quando preciso de escoar muitas das casas que as empresas de construção e promotores imobiliários não conseguiam vender. Agora que muitos estrangeiros investiram no país, vinca, é necessária uma “consistência de políticas e não uma navegação à vista”, referindo-se não só ao investimento estrangeiro em termos gerais, mas também aos chamados residentes não habituais, estrangeiros reformados que compraram casa em Portugal para beneficiar de um regime fiscal favorável.