ADELINO MEIRELES/GLOBAL IMAGENS
Planeamento de voos depende da troca de férias e adiamento de folgas. Pilotos cumprem agora lei à risca e provocam o caos. Reclamam aumento de 42%, TAP só dá 3%. Desde sábado já foram cancelados 50 voos só em Lisboa
Os pilotos da TAP, para pressionarem a administração a negociar um novo acordo de empresa, decidiram não realizar horas extraordinárias e não trabalhar em dias de folga e de férias, passando a cumprir religiosamente os horários e tempos de descanso. Resultado: a companhia aérea liderada por Antonoaldo Neves não está a conseguir cumprir as rotas programadas. Desde sábado já foram cancelados, pelo menos, 50 voos, só no aeroporto de Lisboa. E milhares de passageiros ficaram em terra.
“Todos os meses é feito um planeamento de voos e, durante anos, esse planeamento deu como certas a troca de férias e o adiamento de folgas de muitos pilotos. Algo que era extraordinário tornou-se ordinário”, relatou ao DN/Dinheiro Vivo fonte conhecedora do processo. Há 15 dias, os pilotos disseram basta. A decisão de cortar com o trabalho fora do legalmente estabelecido surgiu depois de uma assembleia geral convocada pelo Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC), em que a inexistência de atualizações salariais e o enorme agravamento da carga fiscal, que já levou muitos destes profissionais para o estrangeiro, estiveram em cima da mesa.
Dessa reunião, sabe o DN/Dinheiro Vivo, saíram duas indicações: reclamar junto da companhia aérea um aumento salarial na ordem dos 42% – a TAP não está disponível para adiantar mais de 3% – e um travão ao trabalho extraordinário e em dias de folga e de férias no período de 24 a 28 de março (inclusive). O último aumento salarial que os pilotos receberam aconteceu em 2007.
Para fora, o sindicato liderado por Alfredo Mendonça pouco disse. Um comunicado de três linhas fez apenas saber que estavam em causa “matérias relacionadas com o regulamento de contratação externa e a atualização salarial”, e que as negociações iriam continuar. O silêncio mantém-se. Contactado pelo DN/Dinheiro Vivo, o SPAC não quis comentar nem as negociações que mantém com a administração da TAP nem a decisão de travar o trabalho fora do calendário. Mas, segundo a Lusa, terá enviado aos pilotos a minuta para pedirem as folgas em atraso.
A TAP também não se adianta nos comentários. Fonte oficial da companhia lembra apenas que “a TAP lamenta os cancelamentos e está a atuar para minimizar os impactos junto dos seus passageiros”. A transportadora assume ainda que os passageiros afetados serão compensados de acordo com as regras, devendo contactar os canais oficiais.
A TAP, revela fonte do setor, sabe que a operação não pode assentar na boa vontade dos tripulantes, seja de cabina ou pilotos, tendo já avançado para a contratação de cerca de 200 comandantes. O processo é, no entanto, demorado.
Nas redes sociais, a indignação dos passageiros tem subido de tom. “O meu voo para amanhã foi cancelado, não conseguem concretizar, não fazem. Toda uma viagem planeada, hotel pago, carro pago e a TAP cancela o voo porque não tem tripulação… e viram só isso hoje ao fim do dia. Vergonhoso?!”, relata um passageiro cuja viagem devia ter-se realizado ontem.
Na Portela, revela um outro passageiro, os efeitos das desmarcações também se sentem. “A fila de pessoas a reclamar com a TAP já chega praticamente à zona de restauração”, conta o português cujo voo para Amesterdão “foi cancelado sem nenhum aviso prévio” e cuja remarcação “volta a ter quatro horas de atraso com as mesmas desculpas de falta de tripulação”.
Não é só nos canais da companhia. À Deco já chegaram vários pedidos de informação de passageiros, a quem a associação está a aconselhar ou a reagendarem viagem para outra data ou a pedir um reembolso financeiro.
A companhia aérea, segundo foi possível apurar, já está a recorrer ao fretamento de aeronaves e tripulações para evitar deixar mais passageiros em terra, numa altura em que muitos portugueses aproveitam as férias escolares para umas miniférias no estrangeiro.