Covid-19 em Vila Flor. A polémica festa de aniversário do presidente na câmara
Município transmontano registou cerca de 70 infetados em 17 dias. Há casos detetados de covid-19 nos bombeiros, agrupamento escolar, Unidade de Cuidados Continuados e câmara municipal, onde uma festa surpresa está a causar polémica. "Politiquice", defende autarquia.
Dezassete dias. Foi este o período que fez Vila Flor, no distrito de Bragança, passar do anonimato no mapa dos casos de covid-19 para um concelho onde o assunto assumiu já contornos alarmantes para a população. Que agora até tem dúvidas sobre a oportunidade de uma festa surpresa de aniversário com que alguns funcionários da autarquia presentearam o presidente Fernando Barros, no passado dia 8 de outubro.
O primeiro caso de infeção foi detetado no dia 11, a partir desse momento surgiram mais de sete dezenas afetando principalmente os serviços da câmara, do agrupamento escolar e da Unidade de Cuidados Continuados, neste momento a situação mais preocupante com 24 casos: 20 utentes e quatro funcionárias, que como estão assintomáticas são elas que tratam dos doentes covid-19. Os bombeiros também registaram um caso, como confirmou ao DN Abílio Evaristo, o vice-presidente da autarquia, que diz só ter conhecimento de 19 casos no UCC.
“É às autoridades de saúde que cabe fazer os inquéritos epidemiológicos e fizeram um bom trabalho. Está tudo identificado e controlado. Estamos já numa fase de recuperação. No caso da câmara municipal os nossos colaboradores estão todos recuperados e em condições de regressar ao trabalho“, adianta o responsável, acrescentando que, no caso dos bombeiros, “só um deu positivo, todos os outros testes foram negativos”.
A festa surpresa que deu em “politiquice”
Com cerca de meia dúzia de casos positivos no agrupamento escolar, acabou por ser a festa, que alguns elementos da câmara organizaram no dia 8 para assinalar o aniversário do presidente da autarquia (Fernando Barros, eleito pelo PS) a dar que falar.
A situação gerou tal falatório na vila que levou os funcionários a ilibar o presidente. Na manhã desta quarta-feira (28 de outubro) foi colocado um comunicado, alegadamente, dos funcionários, na câmara municipal a isentar Fernando Barros de responsabilidades e garantir que todas as regras da DGS foram cumpridas e que desse encontro festivo não resultou infetado algum.
Algo que o vice-presidente também defende. “O presidente nesse dia nem esteve no município e quando chegou é que teve essa surpresa. Foi um grupo de funcionários, onde eu também estava, que comprou um bolo e que no fim do dia, num espaço com todas as condições e com toda a gente de máscara, fez essa homenagem. Não durou mais de 15/20 minutos e todos respeitaram as distâncias. Foi tudo legal, normal. Arrisco mesmo a dizer que não surgiu dali nenhum contágio. Tudo o resto que possam dizer é politiquice baixa. Não tem nada a ver“, frisou Abílio Evaristo ao DN, perante a indisponibilidade do presidente Fernando Barros.
No comunicado, que não estava assinado e levantou dúvidas quanto à sua origem, os os funcionários garantem que a festa de aniversário aconteceu numa altura em que Vila Flor não registava qualquer caso – primeiro dos cerca de 70 casos foi registado no dia 11 de outubro – e não vigorava o atual Estado de Calamidade, decretado a 14 de outubro.
Confrontado pela oposição social democrata, numa reunião de câmara, o presidente socialista do município disse sentir-se “ofendido, caluniado e atingido na sua dignidade” e defendeu-se assim: “ Estranho muito que o Sr. Engenheiro Pedro Melo não tenha tido a mesma atitude no evento realizado em Vila Flor denominado por Sunset.“ A resposta do edil ficou assente em ata, que é pública, assim como o adiamento, para daqui a 15 dias, da discussão pandémica no concelho apesar do crescente números de casos, e de ter mantido a feira semanal (esta quarta-feira, 28 de outubro).
Já Abílio Evaristo destacou ao DN a rápida forma como a câmara reagiu ao primeiro caso: “Quando tivemos o primeiro caso enviámos toda a gente que trabalhava no serviço da pessoa para casa. O delegado de saúde disse que tínhamos feito muito bem.”
Confrontada pelo DN com o surto em Vila Flor e a possibilidade de o mesmo ter tido origem na festa de aniversário do presidente da câmara, a Autoridade Regional de Saúde do Norte disse não conseguir ainda confirmar a origem do surto, que, tal como qualquer outro, “causa preocupação junto das autoridades competentes e imenso trabalho, quer no acompanhamento dos casos então identificados, quer no trabalho epidemiológico de tentativa de identificação de eventuais cadeias de transmissão”.
O distrito de Bragança contabiliza, desde o início da pandemia, cerca de 1551 casos de infeção e 47 mortes associadas à covid-19. Nas últimas 24 horas, Portugal registou quase quatro mil novos casos de infeção pelo novo coronavírus e 24 mortes.