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Pais tiveram de tirar filha dos braços de falsa médica

Com segurança à entrada, com portas com código de acesso e registo obrigatório de visitas, uma mulher entrou no Hospital São João e tentou raptar uma recém-nascida

A Polícia Judiciária vai investigar as circunstâncias e as motivações da mulher apanhada em flagrante delito a tentar raptar uma bebé recém-nascida, no Hospital São João. A suspeita entrou na maternidade, com uma bata de médica vestida e usando um estetoscópio. Acabou por, ao princípio da noite deste sábado, ser travada pelo pai da criança, no momento em que se preparava para sair da enfermaria.

Num primeiro momento, interpelada pelo pai da bebé, a suspeita disse-lhe que iria levar a recém-nascida para fazer exames médicos, mas não terá sabido explicar quais seriam os exames em causa. Segundo avançou o “JN”, as contradições levaram o pai a retirar-lhe a criança dos braços, enquanto outros familiares agarravam a suspeita. Na altura foram chamados os elementos da segurança e a PSP, depois de as auxiliares de ação médica informarem que aquela mulher não trabalhava na maternidade nem tinha identificação como funcionária do hospital.

Agentes da PSP que prestam serviço no Hospital São João, reforçados com elementos da esquadra do Bom Pastor, em Paranhos, detiveram a suspeita. Ao mesmo tempo tentaram perceber se a mulher tinha algum cúmplice dentro ou fora daquela unidade hospitalar que pudesse auxiliá-la na fuga. 

O caso envolve pelo menos esta suspeita, com 48 anos de idade, desempregada, que reside em Vila Nova de Gaia. Os objetivos da tentativa de rapto ainda são desconhecidos, tendo a Polícia Judiciária começado já a investigar. 

Tudo indica que a mulher entrou no principal hospital nortenho durante a azáfama com o horário das visitas, tendo andado discretamente pelos vários andares até chegar ao quinto piso, onde funciona o Serviço de Obstetrícia e Neonatologia, não levantando suspeitas, o que terá sido facilitado por vestir bata médica e ter bem visível o estetoscópio. 

Manto de silêncio da PSP O silêncio que permaneceu ao longo das últimas horas em redor deste caso foi uma forma de não prejudicar as futuras investigações da Polícia Judiciária do Porto. Ao princípio da manhã de hoje será apresentada no Tribunal de Instrução Criminal do Porto a mulher acusada de rapto, a fim de ser submetida a primeiro interrogatório judicial, caso deseje prestar declarações, bem como à subsequente aplicação das medidas de coação.

As incoerências das declarações informais que tem feito, desde o que disse ao pai da bebé até às declarações prestadas primeiro aos seguranças privados do local e depois à PSP do Porto não têm facilitado a tarefa à esquadra do Bom Pastor do Comando Metropolitano da PSP. 

A suspeita pernoitou nas instalações da PSP nas noites de sábado e domingo, para ser hoje levada ao interrogatório. Aí poderá finalmente explicar aos magistrados quais as motivações, se tinha cúmplices e se a bebé era para si própria ou para eventualmente vender a alguém.

Aquilo que se sabe para já, com base nas várias versões da suspeita, é que a bata de médica foi obtida quando era socorrista da Cruz Vermelha Portuguesa, mas ainda não foi possível confirmar a informação.

Inquérito interno no hospital O Hospital São João quebrou o silêncio durante a tarde de ontem e anunciou a abertura de um inquérito interno, a fim de apurar como foi possível a suspeita ter acesso a um local tão reservado, se houve negligência e de quem, bem como para adotar procedimentos futuros que reforcem a segurança, além de saber se houve alguma ação ou omissão que motive o foro disciplinar.

Pena de dois a dez anos de prisão A confirmarem-se as suspeitas, a mulher será acusada dos crimes de rapto/sequestro e de usurpação de funções. Quanto ao último crime, não se sabe se há mesmo enquadramento jurídico-penal, porque a suspeita não terá exercido qualquer ato médico ou de enfermagem. Além disso, o facto de responder por rapto/sequestro na forma tentada pode consumir o de eventual usurpação de funções. Ainda assim, será sempre uma situação com moldura penal que oscila entre dois e dez anos de prisão, dado o agravamento de a vítima ser um bebé, isto é, particularmente indefeso e vulnerável em razão da sua idade.

Segurança nos hospitais O que se passou no Hospital São João não é caso isolado e, para evitar raptos de recém-nascidos, o Ministério da Saúde implementou em 2009 a utilização obrigatória de pulseiras eletrónicas. Ana Jorge, na altura ministra da Saúde, tomou medidas drásticas de segurança nas maternidades e hospitais do país e, no mesmo ano, o Serviço Nacional de Saúde foi reforçado com sistemas de gravação de imagem e de vigilância. Um ano antes das remodelações de segurança, em 2008, deu-se o registo do último rapto. Aconteceu no Hospital Padre Américo, na cidade de Penafiel, quando uma mulher se fez passar por enfermeira para tirar um bebé à mãe sob o pretexto de realizar exames médicos. A mulher – ex-funcionária do hospital de Penafiel – foi encontrada horas depois pela Polícia Judiciária em sua casa, Felgueiras, com o recém-nascido. 

Em 2006, ainda no mesmo local, no Hospital Padre Américo, também um recém-nascido de três dias foi levado enquanto a mãe se ausentou para jantar. Ninguém deu conta e o bebé só foi encontrado um ano depois, em Valongo. Estes dois raptos chamaram a atenção do Ministério da Saúde e foram implementadas as novas medidas. 

Há dez anos que os hospitais controlam as entradas e saídas dos doentes e das respetivas visitas e as portas têm códigos de acesso que apenas são disponibilizados aos profissionais de saúde. 

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