Roubo em Tancos. Diretor da PJ Militar foi detido e PJ prepara nova detenção
Operação da PJ está relacionada com o misterioso aparecimento das armas furtadas em Tancos. Entre os detidos há elementos da PJM, militares da GNR e um civil.
O diretor da Policia Judiciária Militar, coronel Luís Augusto Vieira, foi detido na sede da PJ Militar, no Restelo, em Lisboa, ao final da manhã desta terça-feira. Com ele foram detidos outros elementos da PJ Militar e três elementos do Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Loulé, como já confirmaram o Ministério Público e a Polícia Judiciária em comunicado. Há mais uma detenção no horizonte: um major do Exército que esteve à frente da investigação dos últimos meses e que está em missão na República Centro Africana.
Ao Observador, uma fonte da PJ confirmou que foram emitidos oito mandados de detenção e que a operação — apelidada por Húbris (o grego para arrogância, presunção ou excesso) — está relacionada com o “achamento” das armas, ou seja com a recuperação do material de guerra de Tancos, a 18 de outubro de 2017, na região da Chamusca, de material de guerra furtado em Tancos. Esses mandados dizem respeito a quatro elementos da PJ Militar, incluindo o diretor, um civil e três elementos da GNR, que já foram detidos, entre eles o chefe do Núcleo de Investigação Criminal. Não se sabe ainda se todos os oito mandados já foram cumpridos.
A Judiciária pretende ainda avançar com uma nova detenção no âmbito deste caso. Um major do Exército, atualmente a cumprir missão na República Centro Africana e que nos últimos meses liderou, na prática, a investigação da PJM — o mesmo militar que recebeu a alegada denúncia de que o material tinha sido largado na Chamusca — integra a lista de elementos da deter.
A propósito da operação, o Presidente da República já veio, entretanto, lembrar que “insistiu desde o primeiro dia no esclarecimento integral do caso de Tancos e na importância da investigação criminal”. Na mesma nota, publicada na página da Presidência da República na Internet, Marcelo Rebelo de Sousa sublinha que “ainda recentemente, a 10 de setembro, reiterou que esperava desenvolvimentos nessa investigação”. Aos jornalistas em Nova Iorque — onde está para participar na Assembleia Geral das Nações Unidas –, Marcelo remeteu precisamente para essa nota. “[O caso] era tão importante que entendi dever publicar no sítio da Presidência da República uma nota que recordava o que eu penso sobre a matéria, o que eu penso sobre como esclarecer o que está por esclarecer”, disse.
No mesmo sentido, também PSD já reagiu às detenções. No Twitter, o partido escreveu que já a 1 de setembro, na Universidade de Verão, “Rui Rio apontou ausências de respostas sobre Tancos, referindo-se a “uma guerra gravíssima entre a Polícia Judiciária Militar e a própria Polícia Judiciária”.
“Havia coisas muito estranhas, como tive oportunidade de referir. Já percebemos que o Governo não tem respostas para dar, estávamos no patamar judicial e pelos vistos começam a aparecer, e muito bem”, afirmou depois Rui Rio aos jornalistas, sublinhando que “aquilo que está noticiado” é aquilo que o PSD esperava.
No Parlamento, o CDS avançou com um pedido para que seja constituída uma comissão parlamentar de inquérito ao caso. E o Bloco de Esquerda veio dizer que vê como “enorme preocupação as detenções”, mas que ao mesmo tempo mostram que “a investigação não está parada”, quando houve “dúvidas” nesse sentido, sublinhou o líder parlamentar Pedro Filipe Soares em declaração aos jornalistas. O Bloco espera que “rapidamente a investigação chegue a conclusões. Precisamos de saber o que aconteceu e que os responsáveis possam ser encontrados e responsabilizados para encerrar este episódio negro na história militar”.
A operação está a ser conduzida pelo Ministério Público (MP) e pela Unidade Nacional de Contraterrorismo (UNCT). Nas diligências estão presentes os superiores hierárquicos da PJ Militar e da GNR, conforme determinam os Estatuto dos Militares das Forças Armadas: a detenção de militares no ativo, fora de flagrante delito, “é requisitada aos seus superiores hierárquicos pelas autoridades judiciárias”. “Procedimento que foi seguido”, avança o comunicado conjunto enviado pelo Ministério Público e pela Polícia Judiciária. A Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, e o diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Amadeu Guerra, não estiveram no local, ao contrário do que chegou a ser avançado. Coube-lhes, ainda assim, a “entrega formal ao Ministro da Defesa da notificação da diligência pretendida, a qual foi concretizada posteriormente, nos termos da lei, por militar de patente superior”, esclarece também o comunicado.
Foram também realizadas buscas em vários locais nas zonas da Grande Lisboa, Algarve, Porto e Santarém. Fonte da GNR confirmou buscas nos locais de trabalho dos militares detidos, em Loulé, e os inspetores terão estado também nas casas de todos os suspeitos.
Em causa estão factos suscetíveis de integrarem crimes de associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder, recetação, detenção de arma proibida e tráfico de armas.
Na operação participaram cinco magistrados do Ministério Público e cerca de uma centena de investigadores e peritos da Polícia Judiciária. O inquérito está a cargo do DCIAP, coadjuvado pela UNCT da Polícia Judiciária, a qual contou com a colaboração de diversas unidades da PJ, nomeadamente o Laboratório de Polícia Científica.
Recorde-se que o material furtado do Paiol Nacional de Tancos apareceu misteriosamente na zona da Chamusca. Na altura as autoridades disseram que a descoberta se deveu a uma queixa anónima, por isso não havia arguidos. As diligências que se seguiram abriram uma guerra entre as polícias. Antes de avisar a PJ, que investigava o desaparecimento das armas, a Polícia Judiciária Militar envolveu a GNR de Loulé na apreensão, o que causou estranheza por não ser o posto daquela área territorial e o distrito de Santarém também ter Núcleo de Investigação Criminal. Aliás, os postos da GNR locais nem sequer foram informados da descoberta, apurou o Observador. A operação foi feita secretamente e foram recuperadas granadas ofensivas e lança-granadas foguete LAW.
Os detidos serão presentes ao Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa para aplicação das medidas de coação