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Duas investigadoras com o Prémio Pessoa foram recusadas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia

Irene Flunser Pimentel e Maria Manuel Mota. A historiadora e a cientista, conhecida pelo seu trabalho na investigação do parasita da malária, ficaram fora do recente Concurso Estímulo ao Emprego Científico da Fundação para a Ciência e a Tecnologia

Irene Flunser Pimentel recebeu em 2007 o Prémio Pessoa pelo trabalho desenvolvido no estudo do Portugal contemporâneo, focado sobretudo no período do Estado Novo. Maria Manuel Mota recebeu em 2013 o Prémio Pessoa pelo trabalho que tem feito há mais de 20 anos na investigação sobre o parasita da malária, que em 2016 ainda afetava 216 milhões de pessoas, segundo os dados da Organização Mundial da Saúde.

Contudo, tanto a historiadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa como a investigadora e diretora do Instituto de Medicina Molecular (IMM) viram a sua candidatura ao Concurso Estímulo ao Emprego Científico da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) fora da lista de 500 contratados, conta o Observador.

As duas encontram-se assim entre os cerca de 3600 investigadores que não foram contratados pela FCT. Irene Pimentel, que recentemente publicou Inimigos de Salazar, disse-se “surpreendida” ao ver recusado o seu projeto sobre o relacionamento entre a PIDE/DGS e os serviços secretos europeus e americanos, e não quis adiantar detalhes por se encontrar no período de 10 dias em que é possível contestar os resultados.

O projeto de Maria Manuel Mota, contou a cientista ao Observador, “podia trazer desenvolvimentos significativos na investigação da doença”. “Temos resultados preliminares que nos fazem acreditar sabermos a razão pela qual o parasita da malária infeta primeiro o fígado, antes de ir para a circulação. E isso está relacionado com o metabolismo específico do fígado dos mamíferos.”

A reação da cientista? “Alguma perplexidade”, confessa. Maria Manuel da Mota adianta que, em relação ao seu currículo, os avaliadores “focaram-se em coisas que não têm muita relevância” e, quanto ao projeto, financiado por uma das maiores fundações do mundo, a La Caixa, “disseram que era extremamente inovador, mas que não estava bem explicado qual o impacto para a saúde humana”. “Posso passar por arrogante, mas fiz uma proposta cuidada e achei que tinha muitas probabilidades de conseguir a posição”, afirma.

“Sempre foi assim”

“O que nos parece bastante grave é que são nomes da ciência que todos nós conhecemos.Como é que as pessoas chegam a esta fase da carreira e continuam em condições precárias e nem conseguem ter um contrato financiado pela FCT? Estas pessoas já deviam estar há muito tempo nos quadros das instituições em que trabalham”, diz ao DN Sandra Pereira, presidente da Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC).

“Outra questão que nos preocupa é que este concurso era o de 2017, em 2016 não houve nenhum concurso para a contratação de doutorados. Acabou-se o concurso de bolsas de pós-doutoramento e com o concurso de investigador FCT. Seria de esperar que este concurso de 2017 tivesse isso em conta e contratasse muito mais pessoas. Estas 500 contrataçoes ficam muito abaixo daquilo que eram os 400 habituais das bolsas de pós-doc mais os 200 investigadores FCT contratados anualmente”. Esses 600 contratos para doutorados, afirma Sandra Pereira, “foram atribuídos mesmo em anos maus, como 2014/2015”.

Quanto aos que ficam de fora da lista (provisória até que saiam os resultados dos recursos) de contratados, “não vai haver resposta para estes [quase] 4000 que ficaram de fora”, afirma a presidente da ABIC. “Muitos destes 500 que foram os felizes contemplados com este contrato muitos deles têm já concurso aberto ao abrigo da norma transitória 57 [no âmbito da qual serão financiados cerca de 2000 contratos de trabalho] para a contratação de doutorados. Portanto há aqui números que vão ter de ser discutidos com a tutela. É preciso ver que este financiamento não pode ser desperdiçado.”

Maria Manuel da Mota, que não vai apresentar recurso aos resultados do concurso, continuará a liderar a equipa do projeto, mas sem salário. Esse ser-lhe-á pago pela Faculdade de Medicina de Lisboa e pelo IMM.

Os investigadores do instituto que dirige têm o seu salário assegurado até ao final do ano. Depois disso, ficam dependentes do financiamento estratégico da FCT, que será atribuído a partir dos resultados de uma avaliação que ainda não foi realizada. Maria Mota espera sabê-los até ao final do ano.

Outro dos aspetos do concurso que Maria Mota fez notar ao Observador foi uma discrepância entre os quatro diferentes níveis de contrato: investigador júnior, investigador auxiliar, investigador principal e investigador coordenador. “Houve um número maior de atribuições aos níveis de pós-doutoramento [mais baixos] do que aos investigadores independentes.” No IMM, por exemplo, “uma pessoa de pós-doutoramento teve financiamento e o líder do seu grupo não teve”, conta.

A FCT refere que a avaliação das candidaturas é feita por um “painel internacional e independente constituído por peritos” de cada área científica. Quanto à discrepância entre os diferentes níveis de investigadores, declarou ao Observador: “O número de lugares atribuídos aos níveis júnior e auxiliar é maior do que nos dois níveis superiores por também o número de candidatos nesses dois níveis ter sido maior. Proporcionalmente, o número de lugares atribuídos é semelhante em todas as categorias, à exceção da categoria mais alta”.

Segundo adiantou ao DN Sandra Pereira, a FCT e a tutela já terão garantido que até ao final do ano vai abrir novo concurso, que corresponde a 2018, e no próximo ano abrirá o de 2019.

Origem
DN
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