Da “taxa Robles” nasceu uma bolha legislativa sobre especulação imobiliária
A polémica em torno da "taxa Robles" proposta pelo BE parece ter mostrado a outros partidos que a fiscalidade da habitação era um campo onde deviam legislar. Síntese das principais ideias.
Quando até o Banco de Portugal (BdP) já reconhece que há uma bolha inflacionária no preço das habitação, desenvolve-se uma outra “bolha”: a de propostas legislativas sobre o assunto, a apresentar na discussão do próximo Orçamento do Estado (OE 2019).
À “taxa Robles” do BE somam-se agora ideias avançadas por Rui Rio e pelo CDS – o PCP também já tinha avançado com as suas, no caso sobre o IMI, as quais estarão a ser negociadas com o governo.
Tudo isto se somará no Parlamento a uma discussão que já começou sobre 23 diplomas relativos à questão da habitação – mas não incidindo exclusivamente sobre a respetiva fiscalidade -, entre os quais um projeto de lei de bases, dinamizado pela deputada do PS Helena Roseta, também presidente da Assembleia Municipal de Lisboa. A realidade do mercado mostra que desde 2010 não eram concedidos tantos empréstimos para compra de casa em Portugal. A continuar o atual volume de crédito concedido, 2018 pode mesmo vir a bater o valor registado há oito anos, em véspera da chegada da troika a Portugal. As recomendações que o BdP fez em julho (ainda) não surtiram efeito.
“Taxa Robles”
Quem cognominou assim esta proposta do BE foi o CDS. Pela mais óbvia das razões: Ricardo Robles é o nome do vereador bloquista em Lisboa forçado a demitir-se depois de lhe ter sido descoberto um negócio imobiliário em Alfama que apontava para lucros de quase 500% em relação ao investimento inicial. O BE avançou com a ideia em maio – ainda antes do caso Robles. O objetivo é, segundo explicou Joana Mortágua no jornal i, “criar um mecanismo fiscal para taxar a especulação, sujeitando a uma taxa especial quem compra e vende num curto período de tempo e com muito lucro“. A ideia foi apresentada ao governo – Mário Centeno conheceu-a em 19 de julho – e as conversas prosseguiram, entre as Finanças e o BE. Quando o DN, na terça-feira, noticiou que o governo viabilizaria a “taxa Robles”, Carlos César, primeiro, e António Costa, depois, puseram-lhe um fim abrupto. A intenção do BE era colocar a taxa na proposta inicial de Orçamento do Estado para 2019 que o governo terá de apresentar até 15 de outubro no Parlamento. O deputado socialista João Galamba admitiu na quarta-feira na SIC Notíciasque nem António Costa nem Carlos César sabiam que o BE e as Finanças estavam a conversar sobre o assunto. Os bloquistas dizem que vão formalizar a proposta na discussão orçamental e garantem que havia do governo disponibilidade para a discutir a proposta em concreto.
PSD mexe no IRS
Uma das grandes surpresas da polémica entre o BE e o governo foi o facto de Rui Rio, líder do PSD, ter dito, logo na terça-feira, que a ideia bloquista não era “uma coisa assim tão disparatada”. “Uma coisa é comprarmos e mantermos durante X tempo e outra coisa é andarmos a comprar e a vender todos os dias só para gerar uma mais-valia meramente artificial“, explicou. A afirmação teve o condão de colocar outra vez Rio sob fogo da oposição interna no PSD, que não gostou de o ver a admitir uma ideia do BE. Na quarta-feira à noite, ao entrar para uma reunião do Conselho Nacional do PSD, Rio acrescentaria que o partido apresentará uma proposta própria na discussão do OE 2019: “Acho que faz muito sentido apresentar uma proposta que materialize isto: que aqueles que andam a provocar preços especulativos paguem um imposto superior àqueles que não o fazem”, disse, referindo que, em França, quem “retém imóveis” durante décadas nem sequer paga qualquer imposto sobre as mais-valias. Segundo o líder laranja, “quem vende uma casa ao fim de dez anos teria uma taxa, quem vende ao fim de 20 ou 30 anos se calhar não pagaria nada, e quem anda a comprar e a vender pagaria bastante porque anda a inflacionar o preço do mercado”. E do que se trata é de diferenciar a taxa do IRS já existente sobre mais-valias e não “de uma nova taxa”.
CDS baixa tributação
Os centristas aproveitaram o avanço de Rio para estabelecer mais uma vez contraste com o PSD, acusando os sociais-democratas de terem ido “na linha do Bloco de Esquerda, de abrir a caça ao contribuinte”. Ontem, o deputado João Almeida anunciou que o seu partido também terá na discussão do OE 2019 uma proposta própria para que baixem os impostos e seja reduzida a tributação para rendimentos prediais, especialmente de arrendamentos de maior duração. O objetivo é “estimular o mercado de arrendamento”.
PCP agrava IMI
Entretanto, soube-se que o governo estava a negociar propostas sobre este tema com o PCP – e desta vez ninguém desmentiu. Os comunistas querem a criação de um novo escalão no adicional do imposto municipal sobre imóveis, a partir de 1,5 milhões de euros, com uma taxa de 1,5% ou 2%, que tributaria “de forma mais adequada” o património imobiliário de valor mais elevado. Outra ideia é de que, em sede de IRS, os rendimentos prediais, assim como os de capital, quando ultrapassem os cem mil euros deixem de ser tributados autonomamente com uma taxa de 28% e passem a ser obrigatoriamente englobados, sendo tributados de acordo com as taxas normais do IRS do contribuinte (alguém com rendimentos prediais ou de capital acima de cem mil euros terá naturalmente rendimentos coletáveis no IRS taxáveis muito acima dos 28%).