Santana pode causar estragos no PSD? Ai pode, pode
A chamada silly season foi quebrada pela notícia da saída de Pedro Santana Lopes do PSD. Entre os sociais-democratas há quem desvalorize o impacto desta decisão, mas há quem ainda a esteja a digerir.
“Há 40 anos que não existia uma cisão no partido, e ainda mais de um ex-líder e ex-primeiro-ministro e isso tem de se valorizar. Pode causar estragos no partido”, frisa ao DN um destacado militante, que pediu para manter o anonimato.
Mas, ao mesmo tempo que considera “mau” para o PSD esta cisão e a criação de um novo partido à direita, a mesma fonte diz que “Santana não vai ganhar com isto”. É esta também a opinião do antigo líder social-democrata Marques Mendes: “Esta decisão de Santana Lopes não é boa nem para o PSD nem para Santana Lopes. Ambos vão perder.”
O PSD perde porque, diz Marques Mendes, Santana poderá roubar uma fatia de 2% a 3% do eleitorado ao PSD; mas perde Santana porque, reforça, “não acredito que o seu partido tenha grande sucesso”.
Ainda que sem grande alarido público, a saída de Santana é mais uma acha para a fogueira do descontentamento interno. Os opositores de Rui Rio aproveitam para movimentar as bases de apoio, mesmo que todos percebam que, mais do que as fricções e distanciamento em relação à atual direção do partido, o abandono de Santana tem muito mais que ver com sua vontade de correr em pista própria, ao comando de uma nova força política.
Não se conhecem ainda contornos ideológicos do futuro partido. Só as intenções expressas na carta de despedida de Santana aos militantes. Tão-pouco as figuras que poderão segui-lo. Mas no PSD há quem tenha alguma “sangria” de militantes. “Depende muito da atração que o projeto dele venha a ter, porque há muitos que não se reveem na atual estratégia de Rio”, garante outra fonte do PSD. E “se vier a acontecer pode causar estragos eleitorais”, reforça a mesma fonte.
“[O sucesso de Santana] Depende muito da atração que o projeto dele venha a ter, porque há muitos militantes que não ser revêm na atual estratégia do Rio”
Marques Mendes vê mais esses eventuais “estragos” a serem produzidos no CDS, porque afirma que a primeira grande aposta de Santana são as eleições europeias: “Há de apresentar-se seguramente como um partido antieuropeu, muito nacionalista, com uma grande dose de populismo; virado para capitalizar descontentamentos internos e externos.” O que para o antigo líder social-democrata vai obrigar o CDS “a um discurso menos europeu, menos moderado e mais radical”.
Essa é também a opinião de outro destacado social-democrata ligado às questões europeias. “Santana vai tentar ocupar um espaço mais à direita, porque o centro-direita é ocupado por Rui Rio, e isso pode mesmo atrair eleitorado que, descontente com o discurso do PSD, poderia votar CDS.”
Sem o efeito da “novidade”
A possibilidade de sucesso eleitoral de um novo partido à direita suscita dúvidas ao politólogo António Costa Pinto, mas admite que até 2019 “a saída e a continuidade de Santana Lopes na política tem a capacidade de perturbar o PSD”. Após as legislativas, diz, ou prova que teve algum sucesso eleitoral, mesmo que seja pequeno, ou desfaz-se uma vez mais a possibilidade de a direita “descongelar” do figurino que tem desde 1976. “Até agora todos os partidos que tentaram constituir-se à direita não tiveram sucesso”, recorda, mas admite que é possível que um “dirigente político tenha essa capacidade de alterar” a configuração da direita em Portugal.
António Costa Pinto encontra, no entanto, algumas dificuldades no caminho de Santana. “Muitos dos que tiveram sucesso noutros países nessa área política eram pessoas fora da política tradicional e Santana Lopes também não pode ser protagonista de uma imagem política de novidade.”
Mas o professor reconhece que há, após a saída de Pedro Passos Coelho da liderança do PSD, um segmento da direita liberal que é muito critico do novo PSD e relativamente indiferente ao CDS. “Pedro Santana Lopes poderá ser o protagonista desses descontentes e fundar um pequeno partido que tem como função ajudar a alterar o centro-direita em Portugal.”
“Muitos dos que tiveram sucesso noutros países nessa área política eram pessoas fora da política tradicional e Santana Lopes também não pode ser protagonista de uma imagem política de novidade”
António Costa Pinto recorda que esse fenómeno aconteceu à esquerda, nomeadamente com a criação do Bloco de Esquerda (BE). “Começou com dois deputados e depois alterou a representação à esquerda. Algum dia irá acontecer à direita.”
A instabilidade que poderá causar no PSD depende muito, também acredita o politólogo, de quem Santana conseguirá levar consigo. Se não forem pontos de referência do partido menos estragos causa, diz.
As movimentações da oposição
Menos valorizada está a ser a disponibilidade de Pedro Duarte para avançar para a liderança do PSD. As fontes do partido contactadas pelo DN são unânimes em considerar que se trata apenas de um “marcar de terreno” do ex-diretor da campanha presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa.
E justificada, segundo as mesmas fontes, porque há movimentações mais ou menos públicas de outros potenciais candidatos à liderança do partido. A começar por Luís Montenegro, antigo líder parlamentar social-democrata, que voltou a posicionar-se para o pós-2019 em recente entrevista, mas também figuras como Miguel Pinto Luz, ex-líder da distrital do PSD de Lisboa.
Fontes garantiram ao DN que Pinto Luz tem feito várias iniciativas, discretas e sem criar ruído a Rui Rio, mas que apontam para o desejo de protagonizar uma candidatura no futuro. “São todos pessoas da mesma geração, é normal que vão marcando o terreno uns aos outros”, sublinham as mesmas fontes.
“E que resposta dará Rui Rio a desafios como este?”, perguntou Marques Mendes na SIC, no domingo. “Rio vai certamente desvalorizar o desafio e não vai convocar eleições antecipadas dentro do partido”, respondeu.
“Rio vai certamente desvalorizar o desafio e não vai convocar eleições antecipadas dentro do partido”
Esta convicção de que o líder não vai mudar uma linha na sua estratégia ou responder a qualquer desafio é partilhada dentro do partido. Aliás, Rio nem sobre a saída de Santana se pronunciou publicamente nestes dias de férias. Talvez o faça na rentrée, mas certamente será apenas para dizer que lamenta e que cada um segue o seu caminho.