Donald Trump anunciou a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irão, em vigor desde 2016. O Presidente dos EUA admite um novo acordo, mas impõe condições. “Quando quiserem, estarei pronto”, disse.
O Presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou a retirada do acordo nuclear do Irão, tornando obsoleto aquele entendimento internacional que visava impedir o acesso de Teerão a armas nucleares.
“Este acordo desastroso deu a este regime muitos milhões de dólares, alguns em dinheiro vivo, o que é uma vergonha para mim enquanto cidadão e para todos os cidadãos dos EUA”, disse Donald Trump numa declaração esta terça-feira. “Não vamos permitir que cidades americanas sejam ameaçadas com destruição e não vamos permitir que um regime que pede ‘morte para a América’ tenha acesso às armas mais mortíferas do planeta.”
“Temos provas definitivas de que esta promessa é uma mentira”, referiu-se ao compromisso do Irão, firmado em 2015, de suspender o seu programa para o desenvolvimento de uma arma nuclear.
Os EUA fizeram parte do processo negocial deste acordo, que começou a ser preparado em 2013, ainda sob a alçada de Barack Obama, e que entrou em vigor em janeiro de 2016. Meses depois, já em campanha eleitoral, Donald Trump prometeu retirar os EUA deste acordo — promessa que concretiza agora.
“Os EUA já não fazem promessas vãs. Quando eu faço promessas, eu mantenho-as”, sublinhou Donald Trump, que anunciou ainda que vão ser implementadas “sanções poderosas” contra o Irão.
Porém, na parte final do seu discurso, Donald Trump admitiu a hipótese de voltar a sentar os EUA à mesma mesa com o Irão para chegar a um novo acordo. “Vamos trabalhar com os nossos aliados para chegar a uma solução real, abrangente e duradoura para a ameaça nuclear iraniana”, disse, referindo que, para isso acontecer, acordo terá de visar também o programa de mísseis balísticos do Irão e as suas “atividades” no Médio Oriente.
“Os líderes do Irão vão dizer, como é natural, que se recusam a fazer um novo acordo”, disse. “O facto é que eles vão querer fazer um novo acordo, que beneficie todo o Irão e o povo iraniano. Quando eles quiserem, eu estarei pronto e disponível”, disse.
No Irão, Rouhani dá ordens para retomar enriquecimento de urânio
Uma das primeiras reações à decisão de Donald Trump partiu precisamente do Presidente do Irão, Hassan Rouhani. Numa comunicação ao país, assegurou que o Irão quer manter-se o acordo e referiu que vai agora entrar em conversações com os países que, além dos EUA, participaram no entendimento em 2015.
“Dei ordens ao ministro dos Negócios Estrangeiros para negociar com os países europeus, coma China e a Rússia nas próximas semanas”, disse. “Se, no final desde curto período, concluirmos que conseguimos beneficiar deste acordo com a cooperação de todos os países, o acordo continuará.”
Porém, Hassan Rouhani não deixou de anunciar outra medida que pode preocupar os países envolvidos no acordo. “Dei ordens à Agência de Energia Atómica do Irão para iniciar as preparações necessárias para retomar o enriquecimento [de urânio] ao nível industrial sem qualquer limite”, disse, segundo a IRNA, agência estatal iraniana.
Macron e aliados “lamentam” a decisão de Trump, Netanyahu gaba-lhe “coragem”
Além de Hassan Rouhani, um dos primeiros líderes mundiais a reagir foi o Presidente de França, Emmanuel Macron. No Twitter, falou em nome dos chamados países E3: França, Alemanha e Reino Unido. Eis as palavras do líder francês: “A França, a Alemanha e o Reino Unido lamentam a decisão americana de sair do acordo nuclear iraniano. Está em causa o regime internacional de luta contra a proliferação nuclear”.
Da parte da União Europeia, a reação também foi negativa para Donald Trump e de apoio ao acordo com o Irão. “Enquanto o Irão continuar a implementar os seus compromissos relacionados com o nuclear, tal como tem feito até agora, a UE estará comprometida com a implementação total e efetiva do acordo nuclear”, disse a Alta Representante da UE para Política Externa e Segurança, Federica Mogherini. “Confiamos totalmente no trabalho, competência e autonomia da Agência Internacional de Energia Atómica, que publicou 10 relatórios a certificar que o Irão cumpriu na totalidade os seus compromissos.”
A Rússia mostrou-se “profundamente desapontada” com a decisão do presidente norte-americano, indicou o Ministério dos Negócios Estrangeiros, denunciando “uma violação grosseira do direito internacional”. “Estamos profundamente desapontados pela decisão do presidente norte-americano de sair unilateralmente” do acordo e de “restabelecer as sanções norte-americanas contra o Irão”, refere o ministério num comunicado.
“Estamos extremamente preocupados por os Estados Unidos estarem a agir contra a opinião da maioria dos Estados (…), violando grosseiramente as normas do direito internacional”, adianta. Segundo Moscovo, a decisão de Trump “é uma nova prova da incapacidade de Washington para negociar” e as “queixas norte-americanas sobre a atividade nuclear legítima do Irão servem apenas para acertar contas políticas” com Teerão.
“Não há qualquer razão para minar o acordo que provou a sua eficácia”, sublinha a diplomacia russa, adiantando que a Agência Internacional de Energia Atómica tem confirmado que Teerão está a respeitar os seus compromissos. O Kremlin já tinha alertado Washington contra o abandono do acordo, considerando que a decisão representaria um duro golpe para o regime da não-proliferação nuclear.
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou aos restantes seis países signatários do acordo nuclear com o Irão que “respeitem totalmente os seus compromissos”, apesar da retirada dos Estados Unidos. “Estou profundamente preocupado com o anúncio da retirada dos Estados Unidos do acordo e o retomar de sanções das sanções dos Estados Unidos”, referiu António Guterres, através do seu porta-voz.
Além de políticos em exercício, também reagiu Barack Obama, ex-Presidente dos EUA e um dos responsáveis do acordo nuclear com o Irão, que entrou em vigor no seu último ano na Casa Branca. “Numa altura em que estamos todos a torcer para que a dipomacia com a Coreia do Norte funcione, ao sairmos do tratado arriscamos perder um acordo que conseguiu, com o Irão, o mesmo desfecho que queremos atingir com os norte-coreanos”, escreveu o ex-Presidente no Facebook.
Em dissonância com grande parte da comunidade internacional, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, elogiou a medida de Donald Trump, que classificou de “valente”. “Israel apoia totalmente a decisão valente do Presidente Trump de rejeitar o acordo nuclear desastroso com o regime terrorista de Teerão”, disse. Sobre o acordo que agora se rasga em Washington D.C., e que o primeiro-ministro de Israel critica fortemente desde o início, disse que era “uma receita para o desastre, um desastre para a região, um desastre para a paz no mundo”. “É por isto que Israel acredita que o Presidente Trump deu um passo histórico”, acrescentou.
Reino Unido, França e Alemanha reunidos com Irão horas antes do anúncio
Ao saírem do acordo nuclear com o Irão, os EUA passam a ser o único país com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas a não fazer parte do acordo. Esta saída é vista com relutância por parte da União Europeia, tal como da totalidade dos restantes países que assinaram o acordo com o Irão. Ou seja, França, Reino Unido, Alemanha, China e Rússia.
As autoridades do Reino Unido, França, Alemanha e a representante da política externa da UE declararam já o seu apoio ao acordo com o Irão, num encontro com o vice-ministro das Relações Exteriores do Irão, Abbas Araghchi, em Bruxelas, esta terça-feira, horas antes da declaração de Trump.
Segundo o The Guardian, a Europa implementaria um novo acordo com o Irão, o Plano de Ação Integral Conjunto, desde que o Irão cumpra as suas obrigações.
“Nós, europeus, continuamos a confiar no JCPoA e na sua implementação total, a partir de nossos próprios interesses de política de segurança”, disse a fonte. “Os acordos de transparência e controle do JCPoA e as restrições do programa nuclear iraniano trouxeram um aumento na segurança”, disse a fonte, acrescentando que seria importante que todos os lados mantivessem contato “para evitar uma escalada descontrolada”.
Trump anuncia oficialmente a decisão às 19h00 de Lisboa, desta terça-feira.